COP30 em Belém: os temas centrais na agenda

Em 2025, a COP30 — 30ª Conferência das Partes da UNFCCC — será realizada em Belém, no coração da Amazónia, entre os dias 10 e 21 de novembro, pela primeira vez na região mais simbólica do planeta em matéria climática. Esta COP aspira a ser uma “COP de entrega”, focada na transformação eficaz dos compromissos climáticos em ações concretas.  

Financiamento climático: o ponto de viragem necessário 

Entre os eixos centrais esperados encontra-se o financiamento climático. Na prática, trata-se de responder à pergunta: quem paga a transição energética e a adaptação às alterações climáticas? 

Na última COP, em Baku (2024), os países concordaram em lançar um plano de transição financeira conhecido como Roadmap de Baku a Belém. Este roteiro prevê um salto sem precedentes no investimento: dos atuais 300 mil milhões de dólares anuais destinados a mitigação, adaptação e perdas e danos, para 1,3 biliões de dólares por ano até 2035. O objetivo é dar maior previsibilidade e confiança, especialmente aos países em desenvolvimento, que há mais de uma década reivindicam a concretização da promessa dos 100 mil milhões anuais feita em Copenhaga (2009) e só recentemente cumprida. 

Especialistas sublinham que esse montante de 1,3 biliões não é arbitrário: resulta de estimativas do IPCC – Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas e do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) sobre o custo real de manter o aquecimento abaixo dos 1,5 ºC. Do total, espera-se que uma parte significativa seja canalizada para adaptação — uma área tradicionalmente subfinanciada face à mitigação — e que fundos de perdas e danos recebam recursos mais robustos e diretos. 

A discussão em Belém promete ser tensa: os países desenvolvidos pressionam por maior envolvimento do setor privado, enquanto os países do Sul global defendem financiamento público previsível e acessível, para evitar depender apenas de investimentos condicionados ao mercado. 

Se o “Roadmap de Baku a Belém” for realmente implementado, a COP30 poderá marcar um ponto de viragem: de um regime de promessas falhadas para um sistema de financiamento climático estruturado, previsível e escalável. 

Mitigação e transição energética: o debate sobre o fim dos fósseis 

Na COP30, um dos momentos mais aguardados será a decisão em torno da aceleração do abandono dos combustíveis fósseis que continuam a ser responsáveis por mais de 75% das emissões globais de gases com efeito de estufa. 

A pressão vem da Avaliação Global (Global Stocktake), mecanismo previsto no Acordo de Paris para verificar, a cada cinco anos, se o mundo está no caminho certo para limitar o aquecimento a 1,5 ºC. A primeira Avaliação Global foi concluída na COP28, em 2023, e trouxe um diagnóstico claro: os compromissos nacionais ainda são insuficientes e o uso de combustíveis fósseis tem de cair rapidamente. 

O relatório apontou que, para respeitar a meta de 1,5 ºC, o mundo precisa de reduzir as emissões em 43% até 2030, face a 2019, e chegar a neutralidade climática até 2050. Isso implica não apenas expandir as energias renováveis, mas também eliminar gradualmente os fósseis sem captura de carbono e travar o financiamento a novas explorações. 

Em Belém, os países estarão divididos: 

  • União Europeia, Estados insulares e América Latina defendem um calendário claro para a eliminação progressiva do carvão e a redução acelerada do petróleo e gás. 
  • Grandes produtores como Arábia Saudita e Rússia resistem, propondo soluções de “abate de emissões” com tecnologias de captura e armazenamento de carbono (CCS). 
  • Brasil e outros emergentes tentam equilibrar, defendendo uma transição justa que combine renováveis, bioenergia e proteção social. 

A decisão em torno deste tema será vista como um teste de credibilidade da COP30: se Belém conseguir fixar metas concretas para acelerar a transição energética, poderá ser um passo histórico para alinhar ação política com a ciência climática. 

Adaptação climática: medir o progresso com o “Programa de Trabalho Emirados–Belém” 

Se na mitigação o objetivo é reduzir emissões, na adaptação climática a questão central é outra: como preparar sociedades e ecossistemas para os impactos inevitáveis das alterações climáticas, desde secas prolongadas até cheias, tempestades ou ondas de calor extremo. 

Um dos principais avanços esperados na COP30 é a implementação do Programa de Trabalho Emirados–Belém” (UAE–Belém Work Programme). Trata-se de um mecanismo criado na COP28 (Dubai, 2023) e agora formalizado em Belém, cujo propósito é definir indicadores concretos para monitorizar os objetivos globais de adaptação previstos no Acordo de Paris. 

Até agora, a adaptação foi uma área marcada por falta de métricas comuns: cada país reportava os seus esforços de forma diferente, o que tornava quase impossível avaliar se o mundo estava realmente a ficar mais resiliente. O novo programa procura resolver esse vazio, estabelecendo parâmetros partilhados para medir, por exemplo, o grau de proteção das comunidades contra eventos climáticos extremos; a resiliência das infraestruturas críticas (como água, energia e transportes); a capacidade dos ecossistemas em continuar a prestar serviços essenciais e a equidade no acesso a soluções de adaptação, garantindo que grupos vulneráveis não ficam para trás. 

Em Belém, os países terão de chegar a acordo sobre quais indicadores globais usar e como reportar progressos de forma transparente.  O Programa Emirados–Belém, se for implementado, poderá transformar a adaptação num dos pilares mais robustos da ação climática global. 

Conservação de florestas e biodiversidade: unir clima e natureza 

A COP30 em Belém terá um peso simbólico inédito: será a primeira conferência do clima realizada em plena Amazónia, a maior floresta tropical do planeta, que funciona como um dos principais sumidouros de carbono terrestres e abriga cerca de 10% da biodiversidade mundial [link artigo Amazónia] 

Um dos grandes eixos da agenda será a integração entre as convenções do Clima (UNFCCC) e da Biodiversidade (UNCBD), frequentemente tratadas em separado. Os cientistas sublinham que não há forma de estabilizar o clima sem proteger ecossistemas e que a perda de biodiversidade agrava diretamente os impactos climáticos. 

Em Belém, espera-se que sejam discutidos três caminhos principais: 

  • Proteção da Amazónia e de outras florestas tropicais 
    A meta de acabar com a desflorestação até 2030 voltará ao centro dos debates. Países amazónicos, como Brasil, Colômbia e Peru, deverão apresentar compromissos conjuntos para travar o desmatamento ilegal, ao mesmo tempo que reivindicam mais financiamento internacional para garantir alternativas económicas sustentáveis às populações locais. 
  • Agricultura regenerativa e uso sustentável da terra 
    O setor agrícola é responsável por grande parte da desflorestação global. A discussão em Belém deve reforçar a promoção de práticas regenerativas como a rotação diversificada de culturas, que restaura solos, aumenta a resiliência a secas e reduz emissões. 
  • Soluções baseadas na natureza (NBS) 
    A restauração de mangais, pântanos, savanas e sistemas costeiros será destacada como uma via para capturar carbono e proteger comunidades contra fenómenos extremos. A COP30 deve impulsionar a integração destas soluções nos planos nacionais de adaptação e mitigação. 

A grande novidade será a aproximação entre as agendas climática e ecológica: pela primeira vez, a COP do Clima procurará alinhar compromissos diretamente com as metas definidas em Montreal na COP15 da Biodiversidade (2022), incluindo o objetivo de proteger 30% da superfície terrestre e marinha até 2030. 

Para os negociadores, o desafio será transformar esses compromissos em financiamento e políticas efetivas, sobretudo em regiões como a Amazónia, onde as tensões entre conservação, produção agrícola e justiça social são particularmente intensas. 

Populações indígenas e comunidades locais: dar voz a quem protege a floresta 

Um dos aspetos mais inovadores da COP30 em Belém será a centralidade dada às populações indígenas e comunidades locais, reconhecidas como guardiãs de alguns dos ecossistemas mais importantes do planeta. Estudos recentes mostram que territórios indígenas na Amazónia têm taxas de desflorestação muito mais baixas do que áreas vizinhas, o que reforça o papel destas comunidades como aliadas-chave no combate às alterações climáticas. 

Para garantir essa participação, a presidência brasileira da COP desenhou a criação de pelo menos quatro “Círculos de Liderança” — espaços de debate de alto nível dedicados a temas como direitos indígenas, envolvimento comunitário, justiça climática e inclusão social. Estes círculos funcionarão em paralelo às negociações oficiais, mas com o objetivo de influenciar diretamente os resultados finais. 

As populações indígenas e tradicionais da Amazónia têm reivindicações claras, como o reconhecimento e proteção dos territórios como condição básica para conservar a floresta; a participação efetiva nas decisões internacionais, para que não sejam apenas “consultadas”, mas sim cocriadoras das políticas, e o financiamento direto e acessível, já que a maior parte dos recursos climáticos internacionais ainda circula pelos governos nacionais ou grandes ONGs, raramente chegando a quem vive na linha da frente da crise climática. 

Ao colocar estas vozes no centro da COP, Belém poderá ser lembrada não apenas como a conferência da Amazónia, mas também como a que finalmente reconheceu que não há transição climática justa sem os povos que historicamente preservam os ecossistemas. 

Saúde e equidade: a crise climática também é uma crise de saúde 

Pela primeira vez numa COP realizada no coração da Amazónia, a saúde terá um lugar de grande destaque. No dia 13 de novembro, durante o “Health Day”, será lançado o Belém Health Action Plan, um plano de ação global que pretende integrar a agenda climática com políticas de saúde pública. 

A iniciativa surge em resposta a evidências crescentes de que as alterações climáticas já representam a maior ameaça à saúde do século XXI, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). O aumento da frequência e intensidade de ondas de calor, a expansão de doenças transmitidas por vetores como dengue e malária, a poluição atmosférica e a insegurança alimentar estão a colocar milhões de pessoas em risco, sobretudo dos grupos mais vulneráveis. 

O plano de Belém deverá incluir compromissos para: 

  • fortalecer sistemas de saúde resilientes ao clima, capazes de responder a crises extremas como cheias, incêndios e secas prolongadas; 
  • garantir financiamento para que países em desenvolvimento consigam adaptar infraestruturas hospitalares e formar profissionais de saúde preparados para novos desafios epidemiológicos; 
  • reduzir emissões do próprio setor da saúde, responsável por cerca de 5% das emissões globais de CO₂, incentivando hospitais a adotar energias limpas, cadeias de abastecimento sustentáveis e transporte de baixo carbono. 

Durante a COP30, a ONU vai inaugurar ainda o Health Pavilion, um espaço de debate e demonstração de soluções, com foco em equidade: como garantir que comunidades pobres, povos indígenas e países do Sul global não sejam deixados para trás na construção de sistemas de saúde climática. 

Ao trazer a saúde para o centro da agenda, a COP30 amplia a noção de ação climática: não se trata apenas de reduzir emissões ou proteger florestas, mas de salvar vidas hoje e prevenir crises sanitárias amanhã.