Os mais ricos são responsáveis pela maioria do aquecimento global desde 1990 

A crise climática é profundamente desigual e as diferenças económicas têm muito mais peso do que se imagina. Um novo estudo publicado a 6 de maio de 2025 na prestigiada revista Nature Climate Change revela um dado chocante: os 10% mais ricos da população mundial foram responsáveis por cerca de dois terços do aquecimento global ocorrido entre 1990 e 2019. 

Intitulado “Extreme inequality, elite emissions and climate change”, o estudo foi liderado por Lucas Chancel (Sciences Po, Paris) e envolveu investigadores de várias instituições internacionais. A equipa analisou as emissões globais de gases com efeito de estufa (GEE) com base no rendimento e património dos indivíduos — e os resultados mostram como a desigualdade está no centro da crise climática. 

Segundo o estudo, os 10% mais ricos da população mundial foram responsáveis por 65% do aquecimento global registado entre 1990 e 2019. Os autores afirmam ainda que a contribuição dos grupos de maior rendimento está diretamente associada ao aumento da frequência e intensidade de fenómenos climáticos extremos. Estima-se que o 1% mais rico tenha contribuído até 20 vezes mais para o aquecimento global do que a média global per capita e que os 0,1% mais ricos tenham contribuído 76 vezes mais. Esta elite inclui tanto grandes consumidores como investidores com carteiras associadas a setores de elevada emissão, como os combustíveis fósseis ou a aviação privada. 

As duas principais vias de contribuição para as emissões 

1. Emissões de consumo direto 

As pessoas com maiores rendimentos tendem a: 
• Viajar mais frequentemente de avião (incluindo jatos privados, altamente emissores de CO₂); 
• Viver em casas maiores, com maior consumo energético, e a terem múltiplas residências; 
• Consumir mais bens e serviços com pegada ecológica elevada (alimentação rica em carne, moda rápida, tecnologia, transporte individual); 
• Adquirir veículos mais potentes e poluentes (como SUVs e viaturas de luxo). 

Estas escolhas multiplicam as emissões individuais dos mais ricos em comparação com a média global. 

2. Emissões ligadas a investimentos 

Menos visível, mas altamente relevante, é o impacto das decisões de investimento: 
• Indivíduos com maior património detêm ações, fundos ou participações em empresas de setores intensivos em carbono, como petróleo, gás, cimento, aviação ou grandes cadeias industriais; 
• Estes investimentos geram emissões indiretas: mesmo sem produzirem diretamente CO₂, os investidores lucram com atividades que o fazem, tornando-se corresponsáveis pelas emissões dessas empresas. 

Conexão com fenómenos climáticos extremos 

O estudo cruza os dados de emissões acumuladas dos mais ricos com os efeitos físicos observados no sistema climático. Conclui que estas emissões aumentaram a temperatura média global de forma significativa, intensificando fenómenos como ondas de calor, secas, incêndios e inundações. Outra conclusão é que as emissões têm impacto desproporcional em regiões vulneráveis e menos responsáveis pelas emissões, como a Amazónia, o sudeste asiático, o sul de África ou pequenas ilhas. Ou seja, reforçam a injustiça climática: quem menos emitiu sofre mais os efeitos. 

Conclusão: uma crise de desigualdade 

O estudo conclui que a crise climática é também uma crise de desigualdade extrema. Uma pequena fração da população global tem uma responsabilidade desproporcional pelos danos causados a todos. 

Os investigadores defendem políticas climáticas urgentes que: 
• Taxem emissões associadas ao consumo e investimento de alto impacto; 
• Regulem estilos de vida ultra emissores; 
• Redirecionem o capital privado para setores limpos e resilientes. 

A justiça climática, afirmam, deve estar no centro das políticas públicas. As comunidades mais vulneráveis, com menor responsabilidade nas emissões, são também as mais afetadas pelas consequências do aquecimento global. Por isso, os autores apelam a uma abordagem diferenciada, que considere não apenas as emissões por país, mas também a desigualdade de emissões entre indivíduos. 

Referência completa: 
Chancel, L., et al. (2025). Extreme inequality, elite emissions and climate change. Nature Climate Change. DOI: 10.1038/s41558-025-02325-x