
O Brasil lidera uma proposta que pode transformar a forma como o mundo financia a conservação ambiental. O Fundo Florestas Tropicais para Sempre (Tropical Forests Forever Facility – TFFF), previsto para ser lançado oficialmente durante a COP30, em Belém, pretende remunerar países que protegem as suas florestas tropicais, reconhecendo o valor global destes ecossistemas essenciais para o clima e a vida no planeta.
Mais de 70 países em desenvolvimento com florestas tropicais poderão aderir à iniciativa, que se posiciona como um dos maiores fundos multilaterais ambientais do mundo.
Valorizar florestas em pé
O TFFF propõe uma mudança de paradigma: pagar pela conservação, e não pela destruição. O fundo irá recompensar financeiramente os países que mantêm as suas florestas tropicais protegidas de desmatamento e degradação, em biomas como a Amazónia, a Mata Atlântica, a Bacia do Congo e o Mekong/Borneu.
Estes ecossistemas são responsáveis por armazenar carbono, regular o ciclo da água e abrigar mais de 80% da biodiversidade terrestre mundial. O TFFF reconhece e valoriza estes serviços ambientais como bens públicos globais, essenciais para a estabilidade climática e económica.
“Durante séculos, explorámos a natureza para gerar riqueza. Agora, é hora de usar essa riqueza para proteger a natureza”, afirmou Marina Silva, ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima do Brasil. “O Fundo Florestas Tropicais para Sempre representa uma viragem de chave — é um mecanismo baseado na lógica de mercado, que mobiliza capital privado e promove uma economia sustentável”.
Um fundo de escala global
O TFFF, se avançar, funcionará como um fundo fiduciário permanente, inspirado nos modelos de fundos patrimoniais (“endowment”) que sustentam universidades e fundações internacionais. A expectativa inicial é mobilizar 25 mil milhões de dólares de países investidores, com potencial de alavancar mais de 100 mil milhões de dólares do setor privado, criando assim uma arquitetura financeira para a conservação global.
Os países beneficiários receberão pagamentos anuais por hectare de floresta conservada (cerca de 4 dólares/ha), com base em dados de monitorização por satélite. Caso o desmatamento aumente, o valor repassado será reduzido.
Povos indígenas e comunidades locais: 20% garantidos
Uma das inovações do fundo é a sua dimensão social. Pelo menos 20% dos recursos distribuídos a cada país deverão ser destinados a povos indígenas e comunidades tradicionais, reconhecendo o papel destas populações como os principais guardiões das florestas tropicais.
“Os povos indígenas sempre protegeram a floresta, muitas vezes sem qualquer apoio. Este fundo pode garantir a autonomia e fortalecer as suas iniciativas nos territórios”, afirmou Sonia Guajajara, ministra dos Povos Indígenas do Brasil.
Estudos da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e do Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e do Caribe – FILAC mostram que as áreas sob gestão indígena sofrem 2,5 vezes menos desmatamento do que outras regiões, comprovando a eficácia deste modelo de gestão comunitária.
Transparência e monitorização
Para receber os recursos, os países deverão apresentar relatórios anuais de monitorização florestal, com base em imagens de satélite e sistemas de controlo verificados. O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) do Brasil é apontado como referência técnica para o modelo.
Os países terão autonomia para definir o destino dos recursos, podendo aplicá-los em programas de pagamento por serviços ambientais, bioeconomia, reflorestamento e políticas públicas de conservação.
A iniciativa é liderada pelo Brasil, com o apoio de Colômbia, Gana, República Democrática do Congo, Indonésia e Malásia, e o envolvimento de países investidores como Alemanha, França, Noruega, Reino Unido e Emirados Árabes Unidos.
O lançamento na COP30, na cidade de Belém, simboliza o protagonismo do Sul Global na formulação de soluções multilaterais para a crise climática — uma demonstração de que a cooperação internacional pode gerar resultados concretos.
Complementaridade com o mercado de carbono
O TFFF será apresentado juntamente com uma proposta de coligação global de mercados de crédito de carbono, também liderada pelo Brasil.
Enquanto o mercado de carbono remunera a captura de emissões (por exemplo, através do reflorestamento), o TFFF paga pela conservação de florestas já existentes, criando uma sinergia entre mitigação e preservação.
Um novo capítulo da política climática global
O Fundo Florestas Tropicais para Sempre surge num momento em que o financiamento climático se torna tema central da agenda internacional.
A meta estabelecida no Roteiro Baku–Belém, acordado na COP29, prevê a mobilização de 1,3 biliões de dólares anuais em apoio à ação climática. O TFFF poderá integrar este esforço, contribuindo diretamente para os Objetivos do Acordo de Paris.
“O TFFF mostra que é possível criar um modelo que alia mercado, solidariedade e conservação. É uma resposta prática ao desafio de financiar o futuro”, concluiu Rafael Dubeux, do Ministério da Fazenda do Brasil.
O Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF) representa uma mudança estrutural no financiamento climático internacional — um modelo que recompensa quem protege, valoriza a natureza como ativo e reconhece que a floresta em pé é o maior investimento no futuro do planeta.



